Destaque em avaliação internacional, rede federal tem professores muito bem pagos, infraestrutura cara e seleção de alunos
Cinthia Rodrigues e Priscilla Borges, iG São Paulo e Brasília |
27/12/2010 11:49
Professores com pós-graduação e bem remunerados, infra-estrutura de
ponta e, em alguns casos, seleção de alunos. Essa é a receita da rede
federal de educação que tradicionalmente tem um bom desempenho no País.
No último índice conhecido em 2010, o destaque foi internacional. Os
resultados dos colégios militares e institutos federais, que compõem o
sistema federal, colocaram os estudantes destas escolas entre os
melhores do mundo no Programa de Avaliação Internacional de Estudantes
(Pisa). Os desempenhos obtidos por eles foram superiores aos obtidos por
França, Estados Unidos, Israel e Canadá e só ficaram atrás de Japão,
Coréia, Cingapura, Finlândia, Hong Kong e Shangai.
O Ministério da Educação (MEC) fez questão de divulgar os resultados
obtidos pela rede federal em separado para mostrar que o Brasil consegue
oferecer ensino público de qualidade. Porém, os diferenciais deste
grupo vão muito além das carências primárias da rede pública comum.
O primeiro ponto de divergência é o investimento. Enquanto o gasto
médio com cada aluno desta etapa de ensino da rede pública de Estados e
municípios foi de R$ 2.317 em 2009, a média de investimento por aluno
nos institutos federais foi de R$ 7,2 mil no mesmo período. Nos colégios
militares, o investimento foi bem maior: R$ 14 mil. Com mais recursos,
essas escolas conseguem oferecer equipamentos, laboratórios,
bibliotecas, computadores, aulas de dança e atividades esportivas. No
caso dos institutos, formação técnica e profissional no turno contrário
ao das aulas.
Professores muito bem pagos
Além disso, podem investir na formação de professores e pagar
salários bem mais altos. A média de um docente da educação básica no
País é de R$ 1,5 mil, segundo o MEC. Quem consegue entrar nos
concorridos concursos públicos dos institutos federais começa a
carreira ganhando R$ 4 mil. Um doutor chega a receber R$ 11,7 mil por
mês. Os gestores da rede federal, por tudo isso, já esperavam os bons
resultados.
O diretor do Instituto Federal de São Paulo, Carlos Alberto Vieira,
explica que a instituição vai do ensino médio integrado ao técnico até a
pós-graduação. "Os professores são contratados para o instituto e podem
dar aula tanto aos adolescentes quanto no mestrado. São profissionais
muito bons", explica.
Getúlio Marques Ferreira, secretário adjunto de Educação Profissional e
Tecnológica do MEC, foi aluno, professor e diretor de institutos
federais. Ele reconhece que a valorização da carreira dos professores,
que possuem planos bem definidos de crescimento e encontram boa
estrutura de trabalho, é um ponto central para o sucesso das escolas
federais. Mas defende que a preocupação com uma formação mais ampla é o
grande diferencial da rede.
“A estrutura de laboratórios, biblioteca, quadras esportivas e de
lazer permite que o aluno permaneça na escola os três turnos. A formação
integral do indivíduo é o que nos orgulha. Nosso objetivo não é manter
uma formação tecnicista”, ressalta o secretário.
Para o Exército, esse também é um dos aspectos fundamentais para o
sucesso dos colégios militares. Os estudantes têm inúmeras atividades
disponíveis, como clubes de estudo, atividades de música, dança e
esportivas.
Para poucos
Hoje, há 38 institutos federais funcionando no País, responsáveis por
354 unidades acadêmicas espalhadas em capitais e cidades do interior.
Segundo Ferreira, eles são responsáveis pelo atendimento de 348 mil
alunos. Até 2014, a expectativa é atender 500 mil jovens.
O sistema de colégios militares é composto por 12 instituições, que
ficam nas cidades de Santa Maria (RS), Porto Alegre (RS), Curitiba (PR),
Rio de Janeiro (RJ), Juiz de Fora (JF), Belo Horizonte (MG), Salvador
(BA), Recife (PE), Fortaleza (CE), Brasília (DF), Campo Grande (MS) e
Manaus (AM). Juntos, eles atendem cerca de 14 mil alunos. O calendário e
a proposta pedagógica é a mesma em todos eles.
Além de pouco numerosas, essas escolas não atendem qualquer aluno. No
caso dos institutos federais, há prova de seleção para distribuir as
vagas que chegam a ter concorrência de 70 inscritos por vaga. “Com
certeza, o fato de pegarmos os melhores tem impacto, mas acredito que
ele não é maior do que a estrutura oferecida pela escola”, pondera
Ferreira. Vieira concorda. "Nossos alunos da Educação de Jovens e
Adultos entram sem seleção e também têm resultado diferenciado", alega.
Alunos dizem que fazem a diferença
Os alunos pensam diferente. Para a maioria, o diferencial é a seleção,
tanto de professores, quanto deles mesmos. "Aqui todo mundo tem um
grande interesse em aprender", comenta Laerte Vidal Júnior, de 17 anos,
que estudou em escolar particular antes de ser aprovado na seleção do
Instituto Federal de São Paulo. O colega Ricardo Oba Costa, da mesma
idade, é uma amostra do interesse pelo conhecimento. "Estou fazendo
técnico em informática para aprender mais conteúdos da área de exatas.
Pretendo cursar filosofia ou sociologia e sou realmente bom nas áreas de
humanas, por isso vim para cá, para me ensinarem o que eu não sei",
comenta.
Os amigos Caio Nery, de 17 anos, e Carolina Costa Silva, de 18, também
acham que os alunos são o grande diferencial. Os dois estudaram o ensino
fundamental em particulares, e ela chegou a fazer um cursinho para
passar no Instituto Federal de São Paulo. "Sempre quis o melhor. O fato
de todos aqui serem inteligentes, bem preparados e interessados faz as
aulas renderem mais e os professores poderem ir mais longe", avalia ela.
No caso dos colégios mantidos pelo Exército, 70% dos alunos são
filhos de militares (que ainda estão na ativa) e entram sem provas de
seleção. Os outros 30% são civis ou militares que precisam passar em
concurso. A prioridade das vagas nas escolas é para os estudantes que
são transferidos de cidade com os pais.
Perspectivas ampliadas
Para Ângela Menezes, diretora do campus de Planaltina do Instituto
Federal Brasília, o papel das escolas federais mudou ao longo dos anos.
Inicialmente, o objetivo era colocar jovens de baixa renda no mercado de
trabalho, os ajudando a definir uma profissão. Com o destaque que a
rede ganhou nos últimos anos, o público e a disputa por vagas mudaram.
“Os alunos sabem que, além de sair daqui com uma perspectiva
profissional, eles podem ser aprovados nos melhores vestibulares do País
e continuar sua formação”, comenta.
No campus de Brasília, um dos dois cursos oferecidos na modalidade
integrada com o ensino médio, o de agropecuária, não tem uma
concorrência grande. Cerca de quatro candidatos disputam cada vaga. Mas a
formação atrai jovens de outros Estados, como Goiás, Minas Gerais e
Bahia. Quem não tem condições de se manter pode disputar uma vaga na
casa do estudante local, onde receberá alojamento e alimentação.
Os 550 alunos da instituição são atendidos por 68 professores. Desse
total, 27 são mestres e sete, doutores. A maioria deles só atua na
escola e pode desenvolver projetos de pesquisa e extensão. O salário
mínimo inicial é de R$ 2,1 mil. Os alunos também contam com psicólogo,
assistente social, médico e dentista para atendê-los. Podem fazer aulas
de dança, teatro, música. “O que precisamos hoje é divulgar melhor a
rede. Todos os semestres sobram vagas aqui”, afirma Ângela.
Os amigos Italo Daniel da Silva, 16, Ellen Cristina Gomes, 16, Geyse
Luiza Fernandes, 16, Bruno dos Santos, 16, Helinton Soares, 16, Marcelo
Ricardo da Silva, 16, e Laércio Mendes, 17, escolheram fazer o ensino
médio junto com o ensino técnico em agropecuária por causa das
possibilidades de mercado. Alguns pensam em cuidar dos negócios da
família, que é produtora rural. É o caso de Marcelo, que saiu da Bahia
para estudar em Brasília.
“Acho que vamos sair à frente dos outros. A gente amplia muito nossa
visão aqui e os professores são muito capacitados”, afirma o estudante
do 2º ano do ensino médio. Para os jovens, a experiência prática
desenvolvida desde o começo do curso favorece a compreensão, inclusive,
de conteúdos teóricos do ensino médio, que talvez não fariam sentido se
restritos às explicações em sala de aula.
Italo conta que dificilmente um professor falta às aulas e isso, para
ele, é fundamental. “Às vezes, temos aulas até domingo”, conta. “Acho
que sairemos à frente na faculdade também”, completa.
Fonte: http://ultimosegundo.ig.com.br/educaca/escolas+federais+sao+bons+modelos+mas+dificeis+de+replicar/n1237897418366.html